Como a Inteligência Artificial está mudando a gestão de operações de TI.
Algoritmos avançados e automação redefinem a gestão de TI, garantindo eficiência e proatividade na resolução de problemas.
Tornar a gestão de TI autônoma, com o uso de algoritmos sofisticados capazes de tomar decisões em frações de segundos, é apenas um dos inúmeros desafios que fazem parte da agenda dos CIOs (Chief Information Officer, ou diretor de TI). Mas, tecnologias emergentes, como a Inteligência Artificial e o Machine Learning, têm auxiliado na prevenção e resposta a falhas, na correção de problemas e na ampliação da eficiência operacional.
Diferentemente dos antigos help desks, que funcionavam quase como um balcão de serviços, os service desks foram criados para maximizar a produtividade das pessoas. Tradicionalmente, isso sempre foi feito de maneira reativa, ou seja, esperando algum problema acontecer para atuar o mais rápido possível na solução. Agora, com a integração da tecnologia nos processos de TI, esse cenário mudou.
Embora a adoção dessas tecnologias traga mudanças mais fundamentais para o time de operações, os modelos de gestão precisam se adaptar para garantir a definição de bons indicadores, além do controle de qualidade, ética e privacidade, conforme pontuou Anaterra Oliveira, CTO da Dasa.
A empresa vem testando o uso da IA como aliada na pesquisa clínica, ou seja, treinar modelos para encontrarem achados clínicos dentro dos laudos de exames disponíveis. Na prática, esses modelos leem os laudos e analisam o surgimento de novos casos, o que ajuda na elaboração de estudos e pesquisas científicas. Já na parte de operações, a tecnologia tem sido usada para a automação de testes, que, antes, eram feitos manualmente, garantindo mais velocidade no desenvolvimento de novos softwares.
No entanto, Anaterra destaca que esses processos são acompanhados de perto pela gestão, para garantir não só a eficiência, mas a qualidade dos modelos. Isso considera aspectos técnicos e éticos. “Nós acompanhamos esses modelos de automação e fazemos a auditoria dos resultados para garantir questões relacionadas à privacidade e ética.”
E não poderia ser diferente em uma empresa que trabalha diretamente com dados sensíveis de pacientes. “Nós não temos, nem vamos ter, IA generativa tomando decisão sobre o paciente. Hoje, todos os nossos cientistas de dados que trabalham com esses modelos também são médicos, justamente para garantir essa qualidade.”
Outra frente trabalhada internamente é a gestão de service desks, tendência que ganha cada vez mais escala no mercado. Thiago Martins, especialista em AI, Data & Analytics da Algar Tech MSP, explica que não adianta mais só estabelecer contratos de serviços rigorosos – como os SLAs (Service Level Agreement) – sem considerar as atuais dinâmicas de mercado.
Mais do que resolver todos os casos dentro de um nível acordado de serviço, hoje, o que se espera é que os problemas sejam identificados e corrigidos proativamente e de maneira transparente para o usuário. Para Martins, os SLAs perdem um pouco de sua relevância a partir disso, dando lugar também a perspectivas como os acordos de níveis de experiência (XLAs).
“Hoje, estamos muito focados em proatividade, identificar problemas e, se possível, resolvê-los com alguma automação. Isso gera uma experiência transparente para o usuário, que não vê o problema acontecendo, pois já resolvemos proativamente um possível contratempo que iria afetar sua produtividade.”
Se, pela ótica da experiência do usuário, não é interessante que o cliente perca tempo com problemas que não fazem parte da sua rotina de trabalho, do lado de quem trabalha no service desk, investir em automatização significa tirar o foco dos profissionais de tarefas repetitivas para que eles possam concentrar seus esforços em demandas mais estratégicas.
“Por exemplo, hoje, podemos resetar senhas automaticamente, sem precisar de um humano para isso. O analista de service desk agora foca em processos e problemas mais complexos, com o apoio de IA.”
Essa integração de Inteligência Artificial, entre outras tecnologias emergentes, como ferramenta na gestão de TI, aplica-se a várias áreas, como digital workplace, cibersegurança, cloud e gestão de infraestrutura.
A tecnologia também é aliada na resolução de outras demandas alinhadas à experiência do usuário, como a personificação.
Aplicações de IA na gestão de TI
Apesar do “hype” em torno da IA, encontrar um caso de uso para a tecnologia é um desafio. A pesquisa “How Gen AI puts organizational AI maturity to the test”, realizada no terceiro quadrimestre de 2023 pelo Gartner, aponta que 49% dos entrevistados acreditam que o principal obstáculo para a adoção da IA nas organizações é a dificuldade em estimar e demonstrar o valor dos projetos que utilizam a tecnologia.
Segundo Rayner Pires, Tech Lead na Algar Tech MSP, “a IA – na verdade, a tecnologia em geral –, mas especialmente a IA, tem evoluído demais e muito rápido. As empresas começaram a criar a expectativa de gerar aquele conceito quase de suporte invisível, em que não é necessário acionar o suporte para resolver qualquer problema”.
Na Algar Tech MSP, a tecnologia vem sendo usada para monitorar os computadores dos usuários e, a partir de modelos preditivos, identificar possíveis problemas ou gargalos de memória que possam ocorrer. O especialista cita a ferramenta Estella, que promove o atendimento proativo de tickets de service desk, atividade tradicionalmente feita por pessoas.
Para a experiência do usuário, por exemplo, a Estella atua como uma plataforma de IA, com assistente virtual especializada em service desk, capaz de resolver diversos tipos de problemas de forma autônoma e preventiva. Mesmo que o foco seja atender casos de uso em service desk, a ferramenta também pode se expandir e adicionar capacidades para atender a outros setores, como o de Recursos Humanos, centralizando tudo em uma experiência única.
Já na gestão de infraestrutura de TI, os modelos preditivos auxiliam na previsão de capacidade dos ambientes, especialmente para empresas com picos de uso em datas específicas, como lojas online. Isso ajuda a evitar sobrecarga e otimizar custos, garantindo a perenidade dos negócios.
Seja em um e-commerce ou em um sistema de matrícula, provisionar a capacidade adequada garante uma experiência mais fluida, sem comprometer o processo de vendas ou a satisfação do usuário.
“Quando o cliente entra no e-commerce para comprar alguma coisa na Black Friday, ele quer que o site funcione da mesma forma que nos outros dias. Mas, para garantir esse suporte invisível, tem um monte de coisa rodando por trás: um monte de tecnologia, muita Inteligência Artificial, pessoas também trabalhando em parceria com tudo isso para manter tudo funcionando. Mas, para o usuário, o que importa é que a experiência dele foi fluída. Ele começou e terminou o que precisava fazer, sem ter nenhum atrito.”
No fim, provisionar adequadamente a capacidade desses sistemas auxilia no atingimento de diferentes objetivos, como equilibrar a continuidade do negócio, a experiência do usuário e, também, controlar os custos para manter o funcionamento da operação, algo essencial especialmente em operações de alta criticidade. Um dos casos de uso para a integração entre pessoas e IA é usar a inteligência humana para supervisionar o trabalho da tecnologia. é usar a inteligência humana para supervisionar o trabalho da tecnologia.
“Eu enxergo a Inteligência Artificial não só como um funcionário virtual da empresa, mas como uma ferramenta que os colaboradores vão usar para executar o trabalho de forma mais rápida e com mais valor agregado”, ressalta Leonardo Caetano de Siqueira, gerente de operações e especialista em digital workplace na Algar Tech MSP.
Na própria Algar Tech MSP, quando a Estella foi criada, em 2018, existiu o medo da substituição por parte das equipes. “Eles não perderam o emprego. Ao contrário; aprenderam uma nova ferramenta, uma nova maneira de trabalhar. Em vez de reduzir as pessoas, nós as transformamos em curadoras responsáveis por garantir que a plataforma continue aprendendo e fornecendo a resposta correta para o usuário quando ele precisar.”
Apesar do cenário promissor, a maturidade dos profissionais quando o assunto é Inteligência Artificial ainda precisa melhorar.
“Hoje, temos poucos profissionais capacitados em IA. Falamos muito de Machine Learning, deep learning, IA generativa e tudo mais, mas nem todo mundo sabe qual é o poder real de uma ferramenta como essa. Precisamos amadurecer muito com relação a isso, aprender mais sobre como funciona, saber fazer as perguntas corretas para obter o melhor resultado.”
Anaterra Oliveira complementa que cada setor tende a olhar para a IA de uma maneira. Na Dasa, por exemplo, a área de Tecnologia é mais receptiva e interessada em aplicar diferentes testes com IA – prática incentivada pela empresa. “Eles têm muito mais uma tendência de aderir e não ter receio em usar. Queremos usar para ajudar, empoderar e dar um boost de produtividade nos times. Eu sempre digo que não podemos ter medo de tecnologia; temos de estudar e entender como ela pode ajudar a melhorar nossa produtividade e a vida dos nossos clientes.”
Os especialistas pontuam, ainda, que a cultura de dados e de IA, nas empresas em geral, ainda é algo que está sendo construído. “Temos poucas empresas no mundo que podemos dizer que são fluentes no assunto de dados. Está todo mundo nesse movimento de aprender a lidar com esse volume de dados e novas tecnologias. Como estamos aprendendo, o mercado também não sabe o que esperar, mas não é alarmante como se vê por aí. É mais uma questão de colaboração”, finalizou Thiago Martins.
Questões éticas e projeções futuras
Para Thiago, a IA é a consequência de uma série de questões. “Para termos IA, precisamos de uma governança de dados muito forte, capaz de coletar, tratar e armazenar dados com segurança. IA consome muitos dados, incluindo uma grande quantidade de dados pessoais, mas isso exige um tratamento muito sério e correto desses dados, respeitando regulamentações, como a LGPD.”
De acordo com os especialistas, uma estrutura de governança de dados correta e bem-feita garante a privacidade e conformidade. Mas ainda há problemas com a IA generativa. “Se treinada com dados enviesados, o sistema pode dar respostas enviesadas, ferindo princípios éticos e legais. Já vimos casos no mercado em que isso aconteceu”, disse Leonardo Caetano de Siqueira.
Por isso, a importância de se ter pessoas para acompanhar o resultado e entender se o que ela está entregando faz sentido ou precisa de revisão.
Outro problema no contexto brasileiro é a falta de regulamentação. Segue em análise, no Senado Federal, o projeto de lei (PL 2338/2023) que visa a regulamentar o setor. O texto é de autoria do presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e relatoria de Eduardo Gomes (PL-TO). O projeto propõe normas gerais para a concepção, desenvolvimento, implementação, utilização, adoção e governança responsável dos sistemas de Inteligência Artificial no Brasil. Também visa a estabelecer uma Política Nacional de Inteligência Artificial e determina regras para o uso da IA em áreas como Publicidade e Justiça.
“Ainda é um tema muito incipiente. Não ter regulamentação atrapalha demais.”, enfatizou Leonardo.
Projeções futuras
Para o cenário futuro, os especialistas mencionam a importância da tríade: predição, prescrição e automação. Segundo eles, essas atividades vão ser parte do dia a dia da gestão de TI, seja no contato com o usuário ou na infraestrutura de TI, nos bastidores.
A expectativa é de que parte dos problemas de TI que conhecemos hoje possam ser resolvidos de maneira autônoma, usando Machine Learning e Inteligência Artificial. Mas, certamente, outros problemas surgirão. Por isso, as pessoas vão precisar se capacitar em dados e IA para resolver esses novos problemas que ainda não sabemos quais serão.
A aplicação da IA no escopo da otimização de recursos computacionais, segundo eles, também tende a aumentar. Além do emprego da tecnologia em escopos de segurança e resposta a ameaças, especialmente para quem possibilitar a conexão entre dados históricos e arquitetar soluções capazes de dar uma resposta imediata a incidentes ou ameaças iminentes.